Muitos internautas perguntam sobre minha opinião a respeito das discopexias, que são as cirurgias para reposicionamento de dico articular, então decidi fazer uma postagem deixando bem clara minha posição.

Em minha experiência clinica pessoal de 14 anos de atendimento exclusivamente de pacientes com disfunção e patologia da ATM, tenho recebido muitos pacientes que já passaram por esse tipo de cirurgia e depois tiveram problemas que vão desde artroses (degeneração da cartilagem articular e do osso abaixo dela) até complicações relacionadas à dor e movimentos da mandíbula. Os problemas tem aparecido entre um e quatro anos após a cirurgia. Do ponto de vista científico, não há nenhum trabalho publicado até a presente data (06.06.2013) que mostre, por meio de um nível de  evidência científica apropriado, que  estes discos que foram reposicionados cirurgicamente continuam no lugar correto.

Uma das técnicas de discopexia mais usadas no Brasil é a plicatura com âncora de Mitek, que utiliza uma espécie de presilha intra-óssea chamada de “âncora”, que é fixada na parte de trás do côndilo e possui fios de sutura que se prendem ao disco.

discopexia - cirrugia de reposicionamentodos discos da ATM

Discopexia – cirurgia de reposicionamentodos discos da ATM

Utilizando as palavras chaves  ” TMJ + Mitek + ancor ” até a data desta postagem (15.02.2016), aparecem apenas 11 publicações na PubMed (a maior biblioteca online do mundo, com mais de 25 milhões indexações de artigos científicos oriundos dos principais bancos de dados):

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Bom, para saber se os discos continuam bem posicionados a longo prazo, é preciso conferir a sua posição por meio de imagem  de ressonância magnética (IRM). Entretanto, ao acrescentarmos  a expressão “MRI” (imagem por ressonância magnética, em inglês) aparecem apenas TRÊS trabalhos!

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Destes três, o primeiro simplesmente descreve a linha de trabalho de um dos autores, usando a IRM apenas no diagnóstico do caso.

Já o trabalho de Spallaccia et al. utilizou IRM  para avaliar a posição dos discos apenas um mês após a cirurgia, sendo que dos 30 pacientes operados, sete tiveram seus discos novamente deslocados (ou ficaram mal posicionados), conforme pode ser visto no trecho abaixo:

Göçmen G et al

Isso dá pouco menos de 1/4 dos pacientes operados com problemas no disco apenas um mês após a cirurgia, ou seja, uma probabilidade de aproximadamente 23% de dar errado!

Fica fácil de entender, como mostrei em outra postagem (aqui) a quantidade de casos que chegam para mim com este tipo de problema…

Da busca na PubMed, restou apenas o trabalho de  Göçmen G et al, que efetivamente realizou IRM um ano após a cirurgia de discopexia. O problema maior deste trabalho é que possui uma casuística muito pequena, apenas SETE pacientes! Do ponto de vista científico, essa é uma evidência muito, mas muito limitada para endossar uma técnica…

Uma curiosidade, é que os autores colocaram uma das imagens de controle de um ano da cirurgia que é esta abaixo:

Göçmen G et al

Nessa imagem, o disco está de fato recapturado, no entanto o côndilo está excursionando sobre o disco quase ao ponto de passar à frente dele, comprimindo-o de tal maneira neste ponto, que o disco está extremamente afilado e quase por perfurar-se!

Göçmen G et al 2

O que eu achei curioso é que de sete casos, colocaram apenas esta imagem…

Entendo que a ideia era apenas exemplificar e, sendo assim, suponho que não tenha sido colocada no trabalho uma imagem qualquer, mas sim a melhor delas. Logo não consigo deixar de pensar que se essa é  melhor, como ficaram os demais pacientes? 

Que fique claro que não sou contra a cirurgia de discopexia, mas sim contra o uso indiscriminado da técnica  sabendo-se da falta de suporte e evidência a favor dela. Certamente deve haver algum caso que se possa beneficiar desse procedimento…