É muito comum, pacientes chegarem ao consultório com uma ressonância magnética  (RM) da ATM em mãos com um laudo descrevendo que os achados de imagem se encontram “dentro dos padrões de normalidade”. Mas será isso confiável?

As imagens abaixo são de um paciente recém chegado aqui na clínica cujo laudo da RM descreve os discos como afetados por algum grau de processo degenerativo tecidual mas “NORMOPOSICIONADOS”, ou seja, em posição “normal” em relação ao côndilo e fossa articular (lembrando que normal não é sinônimo de sadio. Para entender essa diferença leia: Normal vs. Sadio: o cuidado ao se avaliar a ATM).

Como se pode ver, o laudo não está compatível com a imagem e esta falha é bastante séria. O paciente passou por vários tratamentos,  mas essa lesão estrutural passou despercebida!!! Em situações assim, especialmente quando o paciente apresenta dores em região dos músculos masséteres e temporais, sem estalos, sem crepitação,  sem limitação da abertura de boca e sem desvios significativos é muito comum que o paciente fique sendo tratado apenas para uma “disfunção muscular”, que foi o que mais ou menos aconteceu com este paciente, à despeito da artralgia (dor na própria articulação) que o mesmo apresentava. Aliás, utilizando os critérios do RDC/TMD que é um dos protocolos  mais utilizados em DTM, esse paciente receberia “dois diagnósticos” (entre aspas mesmos pois em realidade não são diagnósticos, apenas classificações): DTM muscular” e outro de “artralgia”.

Se o profissional que acompanha o paciente tem treinamento em interpretação de ressonância magnética no campo da ATM, ele pode então perceber  o erro e,  no caso de quem segue o RDC/TMD, poderia  reclassificá-lo também como “deslocamento de disco com redução” ( a imagem da redução/recaptura do disco em boca aberta eu não postei). Entretanto, o mais comum é que nem seja feita a RM, já que o paciente não apresenta maiores sinais de problemas articulares e permanece apenas a classificação de artralgia, limitando as possibilidades terapêuticas.

Esse tipo de coisa acontece por um motivo que mencionei em outra postagem: geralmente, o profissional que trabalha com ATM tem pouco treinamento em interpretação de exames de imagem, enquanto que o radiologista geralmente tem pouco acesso aos dados clínicos e muitas vezes também não possui um treinamento específico em patologia da ATM.

É importante entender que isso NÃO significa que o radiologista seja ruim. Não é isso. Pelo contrário, em realidade, os radiologistas possuem muita facilidade em identificar  problemas subclínicos, pois já possuem o “olho treinado” para identificar problemas anatômicos e de formação de imagem. Veja que no laudo em questão, embora o radiologista não tenha descrito corretamente a posição dos discos, foi muito eficiente em descrever as alterações degenerativas do disco e da estrutura óssea do côndilo. Assim, no caso da  ATM, os radiologistas precisam apenas saber o que exatamente devem procurar, bem como entender quais são as características que são importantes de serem ressaltadas para o clínico. Com isso, um radiologista já fica munido de todas as ferramentas necessárias para descrever laudos de ATM com maestria. Conheço excelentes radiologistas, tanto médico como dentistas, que produzem excelentes laudos.

De maneia similar, o clínico de ATM, seja ele dentista com aperfeiçoamento ou especialista em DTM e dor orofacial ou mesmo fisioterapeutas e outros profissionais cuja prática se relaciona de alguma maneira com a ATM, precisa ter também um treinamento em diagnóstico por imagem, justamente para não deixar passar despercebidas, as situações como essa que descrevi aqui.

É por esse e outros motivos que desenvolvi, em conjunto com o professor Dr. Jorge A. Learreta, da Argentina e com a Prof. Dra. Jane Matos, o curso de DIAGNÓSTICO POR IMAGEM NAS DISFUNÇÕES E PATOLOGIA DA ATM.

Agora, voltando à questão do paciente, imagine passar por vários tratamentos, diferentes profissionais, sem ter uma classificação efetiva da situação por CINCO ANOS!!!  Com uma forte dor na face, DIÁRIA, com uma perda importante da qualidade de vida e parte da falta de identificação do problema é porque o laudo não descreve corretamente as lesões da ATM e quem atendeu clinicamente o paciente também não tinha treinamento para interpretar as imagens!

Agora pense que isso não é a exceção. Tenho um banco de dados cheios de laudos descrevendo ATM “normais”,  mas que possuem graves problemas que vão de pequenas alterações morfológicas ( de formato da estruturas ) da ATM até sérias necroses e tumores…